Jurisprudência em Destaque # 45 – Eficácia de EPI. STJ/Tema 1.090. Distinções

Quem atua com direito previdenciário tem observado com uma certa frequência decisões judiciais no âmbito recursal determinando o sobrestamento de processos em que se discute a (in)eficácia dos equipamentos de proteção individual. 


Isso ocorreu, inicialmente, por conta da proposta de afetação identificada como GRC-STJ 27, assim delimitada:

  • se para provar a eficácia ou ineficácia do EPI (Equipamento de Proteção Individual) para a neutralização dos agentes nocivos à saúde e integridade física do trabalhador, para fins de reconhecimento de tempo especial, basta o que consta no PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário) ou se a comprovação pode ser por outros meios probatórios e, nessa última circunstância, se a prova pericial é obrigatória; e 
  • se a exposição a agentes químicos reconhecidamente cancerígenos determina a irrelevância da utilização de EPI (Equipamento de Proteção Individual) para a caracterização da especialidade.

Essa mesma proposta foi remodelada pela Ministra Assusete Magalhães, sendo restringida à seguinte controvérsia: 

se o que consta do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), por si só, é suficiente para provar a eficácia ou a ineficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), na neutralização de agentes nocivos à saúde e na manutenção da integridade física do trabalhador, para fins de reconhecimento de tempo especial.

Por fim, a discussão foi objeto de nova reformulação, desta vez, por meio da decisão que afetou o Tema 1.090, outrora cancelado por questões processuais. No novo recorte, o Superior Tribunal de Justiça delimitou os seguintes pontos a serem dirimidos:

1) Saber se a anotação positiva no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) quanto ao uso do Equipamento de Proteção Individual (EPI) eficaz comprova o afastamento da nocividade da exposição aos agentes químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física.


2) Saber a qual das partes compete o ônus da prova da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), em caso de contestação judicial da anotação positiva no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP).

Muito embora a controvérsia possua contornos específicos, tem-se notado o uso desmedido dessa temática como fundamento para o sobrestamento de processos em que se discute a eficácia do EPI.


Mas, será que toda e qualquer discussão envolvendo EPI deve permanecer suspensa aguardando pronunciamento pelo STJ?


Acredita-se que não. 


Como já foi afirmado várias vezes nesta coluna, o objetivo precípuo de um precedente é conferir uma orientação para casos idênticos ou semelhantes. Diante de uma incompatibilidade factual e/ou normativa, é possível considerar a distinção.


No caso do Tema 1.090, o voto condutor de afetação excepciona hipóteses relacionadas à (in)eficácia do EPI que não fazem parte do debate que será enfrentado no Tema 1.090. Eis o trecho do acórdão que aborda as situações distintas:

O item 4 trata de casos nos quais a eficácia do EPI não descaracteriza o tempo especial - logo, são casos em que não se deve admitir discussão sobre a eficácia do EPI, porque irrelevante ao julgamento da causa. Nem sempre o uso de EPI eficaz descaracteriza o tempo especial. O próprio STF, no tema 555 da repercussão geral, afirmou que "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria" (ARE 664.335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 4/12/2014). O TRF4 alinhou cinco hipóteses semelhantes no IRDR:


b.1) Enquadramento por categoria profissional: devido a presunção da nocividade (ex. TRF/4 5004577-85.2014.4.04.7116/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Fed. João Batista Pinto Silveira, em 13/09/2017) 

b.2) Ruído: Repercussão Geral 555 (ARE 664335 / SC) 

b.3) Agentes Biológicos: Item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017. 

b.4) Agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos: Memorando-Circular Conjunto n° 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS/2015: Exemplos: Asbesto (amianto): Item 1.9.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017; Benzeno: Item 1.9.3 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017. 

b.5) Periculosidade: Tratando-se de periculosidade, tal qual a eletricidade e vigilante, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI. (ex. APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004281-23.2014.4.04.7000/PR, Rel. Ézio Teixeira, 19/04/2017 )


Em três dessas cinco hipóteses a própria administração previdenciária afirmava, ao tempo do julgamento, o direito ao reconhecimento da especialidade do labor, independentemente do uso de EPI eficaz. Portanto, a prova acerca da eficácia do equipamento seria inútil. Assim, o enquadramento por categoria profissional (art. 291 da IN INSS n. 128/2022), a exposição ao agente físico ruído (art. 290 da IN INSS n. 128/2022) e a exposição a agentes cancerígenos (art. 298 da IN INSS n. 128/2022). Quanto a exposição a agentes cancerígenos, a orientação administrativa foi alterada, em desfavor do segurado, a partir do advento do Decreto n. 10.410/2020, que modificou o art. 68, § 4º, do Regulamento da Previdência Social. 


As outras duas hipóteses mencionadas - agentes biológicos e periculosidade - decorriam da jurisprudência - apesar da falta de reconhecimento administrativo. 


Dadas essas características, não são controvérsias a serem desenvolvidas neste momento. Se, eventualmente, houver disputa quanto a essas hipóteses, pode vir a ser realizada uma afetação específica ao rito dos recursos repetitivos.

Logo, nos casos em que o reconhecimento da ineficácia do EPI derivou dos fundamentos ilustrados na lista consolidada no TRF4/IRDR15, ou seja, enquadramento por categoria profissional, risco à integridade física (periculosidade), agentes biológicos, ruído e agentes com efeitos carcinogênicos listados no Grupo 1 da LINACH, não se pode concordar com o sobrestamento do feito em função do Tema 1.090, notadamente por conta da distinção feita pelo Superior Tribunal de Justiça.


Sob a ótica da nova delimitação feita pela Corte Superior, somente os casos em que a eficácia do EPI tenha sido reconhecida, ou afastada, unicamente pelo fato de o formulário de atividade especial declinar positivamente (ou negativamente) a (in)existência de EPI eficaz, é que se pode cogitar o sobrestamento do processo.


E aqui vale o alerta: processos em que a indicação de EPI eficaz no PPP se referir a período anterior a 03/12/1998, data da publicação da MP 1.729/1998, não se enquadram nessa hipótese, posto que tal fator não era motivo para a descaracterização da atividade especial. 


Portanto, os profissionais que atuam com Direito Previdenciário devem estar atentos às subjetividades do Tema como forma de evitar o sobrestamento equivocado da lide. É preciso, ainda, provocar a discussão sobre os fundamentos que subvencionaram o rol de hipóteses adscrito no IRDR15 pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, pois isso permitirá a realização do distinguishing nos casos de interposição de recurso especial.

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